5.21.2012

Contradizer é uma obrigação cívica

Ia comentar este texto de Manuel Leal Freire, no Capeia Arraiana, mas já ia avançado nos caracteres, de maneira que aqui fica.


Não sei por onde começar. Apesar de reconhecer no autor da resenha um imenso conhecimento de coisas, decerto importantes, não posso reconhecer-lhe acerto nesta crónica. Começando pela questão académica, não deveria haver discussão possível. Comparando com o tempo do estado novo, por exemplo, a melhoria hodierna do ensino público não tem contra possível. Claro que aumentando o número de estudantes, aumenta o número de casos falhados. Mas grassa pelas gerações mais velhas uma espécie de ressentimento pela facilidade com que hoje se consegue estudar. Resquícios de tempos em que se endeusavam as pessoas com estudos superiores, em que cada estudante almejava o olimpo do estatuto social. Agora estuda-se porque sim. Por muito que isso custe, para a maioria das pessoas e para o país isso é bom. Falta calcorrear muita vereda para se chegar a um tempo em que cada licenciatura seja mesmo uma mais valia. Entretanto aperfeiçoamos o processo. Haja políticos decentes para o fazer.
Quanto à tão falada escola industrial, o mais alardeado sofisma dos saudosistas de outros tempos, pouco a acrescentar. Quem reclama a sua falta ignora a rede de formação profissional que o país tem, havendo inclusive um concurso anual da escolha do melhor artífice/empregado/operário, de profissões como soldador, carpinteiro, canalizador, etc.

Das PPP, nada de novo. Quem não concorda que deve haver bom senso e transparência na gestão de dinheiros públicos?

Quanto a Hollande e Strauss Kahn, sabemos que Hollande tem um processo por favorecimento de amigos, no seu anterior cargo público. Quanto às escolhas sexuais do segundo, sem comentários. A moral, tantas vezes pregada, nem sempre se tem em primeira conta afinal.

Por fim, no caso vergonhoso do BPN, uma referência curiosa que vale a pena aprofundar: a seriedade de "Egas Moniz". Das patranhas de História que se ensinam na escola para levantar o ego do pobre Zé Povinho, nenhuma é tão ardilosa como a de Egas Moniz. Além de ser uma lenda contada como verdade, há uma característica essencial da história, sempre passada em branco, como os cheques do BPN. Então valoriza-se o Egas Moniz por ter levado filhos e mulher a caminho da morte, mas não se valoriza o facto de Afonso Henriques, o Rei fundador de Portugal ter mentido com quantos dentes tinha na boca, ao primo? O nosso primeiro rei passa a perna ao primo e nós viramos a cara, olhando com ternura para o aio. Mais uma vez, por muito que nos custe, a trapaça está nas fundações deste país (e de muitos outros). Não o vendamos com uma falsa carapaça de magnanimidade, porque esta será uma carapaça de vidraça estilhaçada. Não nos fiemos no passado para construir o futuro. Aprendamos com ele, mas reconheçamos-lhe os erros, as falhas, o mal e tenhamos a coragem de mudar os vícios que trazemos. Pensarmos que somos os maiores, deixando que as tais tubas da fama nos ensurdeçam, não é, de facto, boa política.

Sem comentários: